segunda-feira, 3 de novembro de 2008



TECENDO A MANHÃ

João Cabral de Melo Neto

1

Um galo sozinho não tece uma manhã:

ele precisará sempre de outros galos.

De um que apanhe esse grito que ele

e o lance a outro; de um outro galo

que apanhe o grito de um galo antes

e o lance a outro; e de outros galos

que com muitos outros galos se cruzem

os fios de sol de seus gritos de galo,

para que a manhã, desde uma teia tênue,

se vá tecendo, entre todos os galos.

2

E se encorpando em tela, entre todos,

se erguendo tenda, onde entrem todos,

se entretendendo para todos, no toldo

(a manhã) que plana livre de armação.

A manhã, toldo de um tecido tão aéreo

que, tecido, se eleva por si: luz balão.

(A Educação pela Pedra—1966)



Pode ser

mesmo não sendo certo

posso voltar

novamente poderei transformar tudo aquilo

acho que poderei concretizar

não petrificar

os meus pensamentos

mesmo que inúteis aos estribos

voltar é diferente do que pensamos

01/01/1990